Outubro

Ver Jesus no Pobre

Desde o momento em que ouviu a voz arcana chamando-o para o apostolado, Padre Giácomo estabeleceu um programa de vida e o seguiu, com fidelidade religiosa, até o último e extremo anseio. Este programa, resumido na frase simples e escultural “Viver de Deus para os pobres; viver de Deus para as almas”, manifesta a ardente caridade da qual seu coração foi tão impelido que formou o ideal de toda sua vida e deu direção a toda sua obra.

Nos pobres, de fato, ele sempre viu Deus, e sempre considerou a pobreza quase como um sacramento.

Para ele, o pobre homem era quase um espelho, no qual, olhando com a luz da fé, ele via Cristo sofrendo, abandonado e desprezado. Sua fé em Jesus Cristo, personificada nos indigentes, consumiu-o ao ponto de acolher os Pobres, descobrindo sua cabeça e estendendo seus braços, com uma explosão de piedade tal que parecia dizer a cada um: “Vinde, vinde, meu Senhor” e acompanhou-os com veneração religiosa, como se quisesse declarar-se indigno de sua hospitalidade.

Os pobres, abandonados por suas famílias, rejeitados por seus conviventes, excluídos pela sociedade, encontraram nele um pai, pronto a acolhê-los com amor, exclamando com infinita ternura: “Eles não são de ninguém… … portanto, são nossos!

Um dia, um senhor, que tinha vindo visitar a Quinta Casa, encontrou o piedoso padre, se preparando para fazer certos serviços humildes a algumas pessoas pobres, que causava repulsa, estando ele ajoelhado e beijando os seus pés e feridas. Maravilhado e surpreso, embora já estimasse o Servo de Deus com um lado excêntrico, ele qualificou esses atos como idolatria, e desaprovava aquele zelo que lhe parecia muito forte. O humilde e piedoso sacerdote, nada ofendido, respondeu gentilmente: “Creio nas palavras de Jesus, que, quanto aos serviços, diz: O que fizestes a um destes meus irmãos menores, a mim o fizestes; e quanto ao servo: Quem dentre vós for o maior, que seja vosso servo. Nunca é demais o que se faz para adorar Jesus e Suas palavras”!

Nas passagens aqui selecionadas, você encontrará o espírito de fé e caridade, que animou o Servo de Deus, difundido como um ensinamento de vida. Se você meditar neles com devoção, seu coração se expandirá de compaixão e amor pelos pobres, a imagem viva de Jesus, e qualquer sacrifício que você fizer por eles parecerá leve e insignificante.

 

 

– 1 –

Se o Senhor considera feito a si o que se faz ao Pobre: “mihi fecistis!” é preciso que no Pobre vejamos Jesus. Por mais deformado e repugnante que se apresente o infeliz, é necessário fechar os olhos da carne para olhá-lo com os da fé; e a fé no-lo mostrará belo, de uma beleza toda divina, como o mais amável entre os filhos dos homens, porque nele está Jesus Cristo.

 

– 2 –

Que sorte para nós poder retribuir a Jesus amor por amor, alimento por alimento, veste por veste, vida por vida! Se Deus nos alimenta, se cobre a nossa nudez, se com materno afeto cuida de nós, restituamos-lhe tudo isso na pessoa do Pobre.

Que desventura, ao invés, rejeitar o miserável que nos pede socorro!… Naquele miserável rejeitamos Jesus!… E com que coragem?

 

– 3 –

O Pobre é a obra mais bela de Deus, o segredo da sua sabedoria.

O rico é o protetor do Pobre; mas este é o salvador do rico, porque lhe oferece o meio de trocar as suas riquezas pela posse do céu.

 

– 4 –

O Pobre, podemos dizer, é o juiz que tem na sua mão a sorte dos grandes e que pode dar as bênçãos ou as maldições. À sua voz, o Senhor fecha ou abre os tesouros da sua misericórdia; por meio da sua humilde oração faz chover sobre os nossos campos a esterilidade ou a abundância.

Os Pobres, e somente os Pobres, têm, por meio da pobreza, as chaves do céu.

 

– 5 –

Os pobres são a imagem de Jesus Cristo. Por isso os santos, não podendo visitar Jesus no sacramento, ajoelhavam-se diante dos pobres enfermos.

Infelizes daqueles que não querem reconhecê-los e apreciá-los; têm os olhos incapazes de enxergar.

Eu gostaria de erguer a minha voz para ser ouvida até os confins mais distantes do mundo, para convidar todas as almas a reconhecer e a servir os Pobres.

 

– 6 –

Quereis ver Jesus?… Olhai os Pobrezinhos! Eles são como um outro sacramento, porque na pessoa do Pobre está escondido Jesus.

Vós que fazeis profissão de amar a Deus, o Deus escondido, Deus absconditus, quereis amá-lo mais? Desejais amá-lo como Ele quer e merece? Vinde comigo, conduzir-vos-ei aos Pobres, à casa do amor cristão, à casa da caridade.

 

– 7 –

Se não quiserdes seguir-me, se disserdes que, para amar a Deus, não é necessário ir aos Pobres, à casa da caridade, escutai o que vos responde no meu lugar o Espírito Santo: “Como se pode amar a Deus que não se vê, se não se ama ao próprio irmão, que se vê esmorecer na pobreza?”.

 

– 8 –

Desejais possuir tesouros? Quereis adquirir o verdadeiro tesouro?… Vinde comigo; tornar-vos-ei ricos! Conduzir-vos-ei ao levita Estevão, a Francisco de Assis, a Vicente de Paulo, a João de Deus. Eles apontar-vos-ão o rico tesouro, na pessoa dos Pobrezinhos: porque os Pobrezinhos são o tesouro de Jesus Cristo. Ouvi sua voz, de fato, que nos diz: “Recomendo-vos o meu tesouro”.

 

– 9 –

Jesus empregou em favor dos Pobres grande parte da sua divina missão, e elevou a pobreza à dignidade de sacramento, fazendo deles um objeto de culto.

Desde o nascimento até à morte, Ele empregou todas as suas fadigas para a salvação de todas as almas: nasceu pobre, viveu com os Pobres, exerceu a sua missão em meio aos Pobres. Realizada a obra da Redenção, não quis deixá-los órfãos, mas tornou-se sua alegria permanecer conosco, e ama repetir: “Vinde a mim, ó pobres aflitos, ó enfermos desolados!… Eu sou o bom Samaritano, e derramo nas chagas das almas o óleo da minha misericórdia e o vinho do meu sangue preciosíssimo.

 

– 10 –

Reavivamos a nossa fé em Jesus, pobre e sofredor, que considera feito a si o que fazemos aos Pobrezinhos. Jesus o quer! De fato diz: “Vim trazer o fogo da caridade, e não quero outra coisa a não ser que se acenda em todos os corações!… Este é o meu mandamento: que vos ameis uns aos outros como eu vos amei!”.

 

– 11 –

O Apóstolo S. Pedro recebeu um grande prêmio, porque na pessoa de Jesus, viu o Filho de Deus e acreditou nele: Jesus o proclamou bem-aventurado.

Do mesmo modo terão o prêmio da bem-aventurança aqueles que, direcionando o olhar além daquilo que é humano, vêem através da pessoa do Pobre, Deus.

 

– 12 –

Sereis afortunados se, na pessoa do Pobre, virdes a imagem de Jesus e o servirdes, hospedando-o com amor.

Ele derramou todo o seu sangue preciosíssimo em favor de cada uma destas almas, feitas à imagem e semelhança de Deus.

Se, pela vossa cooperação, perceber que estas almas adquiridas pelo seu sangue voltam para Ele, oh, como vos será grato, como vos amará, quanta misericórdia não derramará nas vossas almas!

 

– 13 –

Lembrai-vos de Tobias: ele, no exílio, repartia o seu pão com os filhos da escravidão e deixava o almoço para sepultar os mortos, e Deus derramou sobre ele e sobre a sua família os tesouros da sua misericórdia e das suas ternuras.

Do mesmo modo Deus aumente a sua caridade nos vossos corações.

 

– 14 –

Nós somos cristãos; devemos, portanto, praticar as virtudes cristãs, a maior das quais é a caridade. Vivamos sob a lei de Jesus Cristo, que é lei de amor; por isso devemos amar a Deus, amando também os Pobres, especialmente aqueles que, pela condição miserável na qual se encontram, lembram-nos Jesus, o qual tinha perdido o aspecto de homem e se tornara igual a um verme esmagado.

 

– 15 –

Se tu tivesses que prestar um humilde serviço a alguns pobres velhos enfermos, e sentisses nojo e repugnância, animado de viva fé, eleva o teu olhar para ver neles a adorável pessoa de Jesus, tornada irreconhecível; contempla Jesus que, para a salvação das almas, despojou-se do seu divino esplendor, sacrificou a sua beleza humana, carregou as nossas enfermidades, viveu uma vida de dores e de sofrimentos, a ponto de reduzir-se estranhamente a um ser deformado e desprezado, como o último entre os homens e como um verme esmagado.

 

– 16 –

A alma chamada ao apostolado, ciente da missão que deve cumprir, contempla Jesus carregado das nossas enfermidades e das nossas misérias, considera as suas humilhações e os seus padecimentos, e procura não tornar inútil tamanho padecer e desperdiçado o sangue redentor; corre para os Pobres, os quais, por mais miseráveis e desfigurados, possuem uma alma redimida para o céu.

 

– 17 –

Dado que nos membros enfermos devemos ver os membros flagelados e chagados de Jesus, devemos tratar os pobres doentes com fé e reverência, assim como o sacerdote trata o Corpo Eucarístico de Jesus.

 

– 18 –

Não façais diferença entre o Pobre sofredor e Jesus no sacramento. Único amor, única preocupação, única observância é sempre Jesus! Quer corrais à Comunhão, quer corrais ao leito do doente ou a alimentar o faminto, a vestir o nu, a matar a sede do sedento, a ensinar ao ignorante, a admoestar o pecador, a consolar o aflito, a sepultar os mortos, é sempre Jesus! Não diminuais o vosso afeto, não atenueis as vossas preocupações, não esfrieis o vosso fervor. Ele está ao vosso lado, definha por vosso amor, e é isso que vos quer dar, quando por todos estes caminhos vos chama a si, aproxima-se e vos aperta ao seu Coração.

 

– 19 –

Beijemos as chagas de Jesus nas chagas dos Pobrezinhos!… Nas feridas dos enfermos devemos venerar as dolorosas chagas de Jesus Redentor, que carrega as nossas iniqüidades. Devemos considerar que no corpo chagado e nas carnes purulentas dos Pobres está presente uma alma imortal, redimida pelo sangue preciosíssimo do Filho de Deus.

 

– 20 –

No Pobrezinho, pregado sobre o leito das dores, devemos ver Jesus sobre o leito da cruz, e agir de modo que, com toda verdade, possamos dizer-lhe: Ó Jesus, pobre e sofredor, eu sou teu servo!

O Filho de Deus não se desdenhou rebaixar até nós e elevar ao seu lugar os miseráveis, constituindo-os seus representantes, e considerando feito a si mesmo o que se pratica em relação aos Pobrezinhos.

Parece-me que Jesus repita: “Praebe cor tuum mihi!” Dá-me o teu coração. Dá o teu coração aos miseráveis e o darás a mim, que considero feito à minha pessoa aquilo que fazes a cada um destes pobres meus irmãos.

 

– 21 –

Jesus Cristo, pela nossa salvação, tudo fez, até morrer por todos; esta sua caridade não nos permite omitir coisa alguma que possa servir para a santificação dos Pobres, que são nossos irmãos. Ele, a cada um de nós diz: “Segue-me!” Não devemos nós lhe prestar ouvidos? Cada um de nós tem o dever de responder-lhe: “Sim! Ó Mestre divino, seguir-te-ei a toda parte, nos caminhos por onde passas fazendo o bem e curando todas as fraquezas e as enfermidades.  Falsamente chamar-me-ia de cristão se não te seguisse, ó Jesus, Salvador das almas, Pai dos Pobres!”.

 

– 22 –

As almas dos Pobres são abandonadas, como se não tivessem direito ao reino dos céus. Contudo, deles Jesus disse: “Também a estes é necessário que eu reúna, para que escutem a minha palavra e se forme um só rebanho”.

Ajudemos os Pobres com a nossa fé e com o nosso amor. A fé nos faz ver neles os representantes de Jesus, o qual a cada um de nós diz: “Tenho fome, tenho sede, necessito de ti!…”. Faz-nos ver a imagem de Jesus impregnada de sujeira e nos impulsiona a correr para libertá-la da lama onde caiu e a prodigalizar-nos com a mesma religiosidade com a qual nos comportaríamos com sua própria pessoa, se os nossos olhos a vissem mergulhada no barro. O amor nos faz ver nos Pobres a alma necessitada de ajuda para reerguer-se das misérias da terra e elevar-se à esperança do céu.

 

– 23 –

Na pessoa dos Pobres e dos doentes, ainda que sejam os mais repugnantes, devemos ver a pessoa de Jesus Cristo e servi-la com fé, vencendo todo nojo. Se nos encontrássemos naquelas condições tão tristes, gostaríamos de ser rejeitados? E se o nosso pai ou um querido irmão se encontrassem naquelas condições, ou nossa mãe ou uma querida irmã, deixariamo-nos vencer pela repugnância? Teríamos coragem de deixar definhar e perecer os nossos queridos naquelas misérias por temor de sujar nossas mãos?… Se caísse numa fossa imunda uma jóia nossa de ouro maciço, cheia de brilhantes, para não nos incomodar em limpá-la resignaríamo-nos a perdê-la ou a não mais usá-la? E se víssemos uma sagrada imagem no meio das imundícies, não seria o nosso dever tirá-la daquela sujeira e limpá-la? O Pobrezinho, quem quer que seja ele, por mais sujo e nojento, totalmente reduzido a uma chaga e a um cúmulo de misérias, é sempre a imagem de Jesus, carregado dos nossos pecados, igual a um leproso, espancado, flagelado, crucificado por nós, e que por nós quer ser servido na pessoa dos Pobrezinhos e considera feito ou negado a si aquilo que fazemos ou negamos ao Pobre. Quando somos animados de fé viva, o amor que inflama o coração, o zelo que afervora a alma, faz-nos considerar leves e suaves os sacrifícios mais repugnantes.

 

– 24 –

Ama Jesus! Serve-o com amor nos seus Pobrezinhos, e assim terás mais certeza de ter se encontrado com Ele, de o ter tocado e de o ter servido, mais do que se Ele tivesse se apresentado a ti visivelmente. Tem este santo desejo e faze com que o Senhor torne sempre maior em ti este amor e sempre mais forte este desejo.

 

– 25 –

Acolhe o Pobre com grande festa, como uma visita do querido Jesus, mostrando, também exteriormente, a alegria do teu coração pela sorte de recebê-lo na tua casa.

 

– 26 –

Eu não encontro palavras para expressar a inefável alegria que inunda o coração e o espírito, quando se pode ter em nossa casa Jesus, pobre, sofredor, desejoso dos cuidados do nosso amor e tê-lo, não em visão ou em estática contemplação, mas pela fé, isto é, em virtude daquela palavra com a qual nos dá certeza de que é Ele mesmo que recebe a nossa ajuda, o nosso consolo, os nossos amorosos cuidados, quando os dispensamos em favor do mais pequeno, do mais miserável dos nossos irmãos.

 

– 27 –

Quando recebes Jesus na S. Comunhão, Ele diz à tua alma: “Estou aqui, por teu amor!”. Também tu, repete as mesmas palavras a Ele que se apresenta como um pobre, esquecido e sem conforto. O Seu Coração sacratíssimo sentir-se-á muito consolado quando, com sentimentos de fé e de amor, tu Lhe disseres na pessoa do Pobre: “Estou aqui; por teu amor, ó Jesus!”.

 

– 28 –

Agradece a Jesus, quando te conceder a honra de fazer aquilo que Ele fazia nos dias da sua vida mortal, e te der a graça de o visitar e servir na pessoa dos Pobres.

 

– 29 –

Pede a Jesus para que coloque no teu coração os afetos que animavam o Seu Coração, a fim de que, superando com a divina graça a repugnância da natureza, possas aliviar toda dor e elevar as almas a Deus.

 

– 30 –

À oração une a tua cooperação, cultivando o zelo necessário para o bem das pobres almas esquecidas. E os Pobres, após ter sido teus amigos aqui na terra, serão os teus advogados diante do tribunal divino.

 

– 31 –

Não nos esqueçamos de que Jesus considera como dado a si o que damos aos Pobres, e nos julgará conforme a maneira com a qual os tratamos.

Cada Pobre que tivermos salvado será, no dia do juízo, nosso advogado no tribunal de Jesus, e nos apresentará e recomendará ao divino Juiz, dizendo-lhe: “Eis um homem cheio de misericórdia!”.

Que nenhum Pobre, naquele dia, torne-se nosso acusador e Jesus, Juiz, não nos expulse pela nossa falta de misericórdia.